
Este mês de julho iniciou com intensas movimentações políticas e econômicas que colocaram o Brasil no centro do debate geopolítico internacional. Em meio à realização da cúpula do BRICS no Rio de Janeiro, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou por meio de uma carta enviada ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva a imposição de uma tarifa comerciais de 50% sobre produtos brasileiros. A medida surpreende, sobretudo, por sua justificativa: não se trata de uma decisão baseada em critérios econômicos, mas, claramente, de natureza política.
É importante destacar que o Brasil possui um déficit comercial em relação aos Estados Unidos, ou seja, importa mais do que exporta. Sendo assim, não haveria lógica econômica para a imposição de barreiras comerciais como forma de corrigir desequilíbrios. A imposição tarifária anunciada por Trump, portanto, parece ter objetivos mais amplos e preocupantes e podem adentrar na esfera da soberania do país.
Em sua carta, o presidente norte-americano afirma que a medida é uma resposta ao que considera uma “vergonha internacional” e “a condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro e sua consequente inelegibilidade”, conforme Trump, mais uma vez, ataca diretamente o Supremo Tribunal Federal brasileiro e se coloca como defensor do ex-mandatário brasileiro. Esse tipo de interferência externa fere de maneira grave a soberania nacional e coloca empecilhos na relação diplomática entre os dois países.
O histórico de Trump em relação às tarifas é conhecido, instável. Em sua política externa, costuma adotar medidas comerciais agressivas para, em seguida, retroceder e negociar em busca de vantagens. No entanto, mesmo que a tarifa imposta ao Brasil seja reduzida pela metade, ainda assim resultará em um acréscimo expressivo de 25%, o que prejudicará profundamente as exportações brasileiras.
No documento que fundamenta a nova tarifa, Trump afirma — sempre sem apresentar provas — que a decisão é motivada, “em parte, pelos ataques insidiosos do Brasil contra as eleições livres e pela violação da liberdade de expressão dos americanos”. Ou seja, ele tenta relacionar a punição política sofrida por Bolsonaro a um suposto ataque à democracia norte-americana. A narrativa ignora completamente o devido processo legal conduzido pelas instituições brasileiras.
Outro fator que contribui para a retaliação comercial está relacionado à discussão sobre a regulamentação das redes sociais no Brasil. A atuação do ministro Alexandre de Moraes, nesse sentido, tem incomodado empresas de tecnologia (as chamadas big techs), que são importantes financiadoras da campanha de Trump. A reação, portanto, também é movida por interesses econômicos e eleitorais.
Além disso, o contexto geopolítico não pode ser ignorado. O encontro do BRICS no Brasil reafirma o compromisso do bloco com o multilateralismo, com a busca por uma nova alternativa ao sistema monetário internacional dominado pelo dólar e com a intensificação da cooperação Sul-Sul. Esses movimentos contrariam a lógica protecionista defendida por Trump e ameaçam diretamente a hegemonia econômica dos Estados Unidos e da Europa.
O BRICS representa mais de 42% da população mundial, 30% do território do planeta,
23% do PIB global e 18% do comércio internacional e inclui potências populacionais e econômicas como Índia e China. A crescente influência do bloco desafia a ordem internacional estabelecida e é percebida, por líderes conservadores norte-americanos, como um obstáculo geopolítico. Portanto, não se trata apenas de Bolsonaro. O lobby realizado por seu filho nos Estados Unidos é apenas parte de uma estratégia mais ampla, que busca deslegitimar as instituições brasileiras e, ao mesmo tempo, conter o avanço de uma nova ordem multipolar.
Diante de tais fatos, o Brasil deve manter firme sua posição diplomática, defender sua soberania e fortalecer o diálogo com parceiros estratégicos. O que está em jogo não é apenas a política interna brasileira, mas os rumos da política internacional em um mundo cada vez mais complexo e disputado.
Israel Aparecido Gonçalves é cientista político e escreve sobre Relações Internacionais, Conflitos e Direitos Humanos. Atualmente é doutorando em Sociologia e Ciência Política pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Mestre em Ciência Política pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), é graduado em História e Filosofia. Organizou mais de 20 livros nas áreas de Educação e Ciências Humanas e possui 131 artigos de opinião publicados em diversos sites e jornais do país. Seu livro mais recente é “Sociologia e Direito – Volume 3”, lançado pela Editora Periodicojs em 2025.
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